Às novas exigências de competitividade que marcam o mercado globalizado,
exigindo cada vez mais qualidade com menor custo, a base técnica de produção
fordista, que dominou o ciclo de crescimento das economias capitalistas no
pós-Segunda Guerra até o final dos anos 60, vai aos poucos sendo substituída
por um processo de trabalho resultante de um novo paradigma tecnológico apoiado
essencialmente na microeletrônica.
Estabelecem-se novas relações entre trabalho, ciência e cultura, a partir
das quais constituísse historicamente um novo principio educativo, ou, seja um
novo projeto pedagógico por meio do qual a sociedade pretende formar os
intelectuais/trabalhadores, os cidadãos/produtores para atender às novas
demandas postas pela globalização da economia e pela reestruturação produtiva.
O velho principio educativo decorrente da base técnica da produção
taylorista/fordista vai sendo substituído por um outro projeto pedagógico,
determinado pelas mudanças ocorridas no trabalho, o qual, embora ainda
hegemônico, começa a apresentar-se como dominante.
O principio educativo que determinou o projeto pedagógico da educação
escolar para atender a essas demandas da organização do trabalho de base
taylorista/fordista, ainda dominantes em nossas escolas, deu origem às tendências
pedagógicas conservadoras em todas as suas modalidades, as quais, embora
privilegiassem ora a racionalidade formal, ora a racionalidade técnica, sempre
se fundaram na divisão entre pensamento e ação.
A globalização da economia e a reestruturação produtiva enquanto macro
estratégias responsáveis pelo novo padrão de acumulação capitalista,
transformam radicalmente esta situação, imprimindo vertiginosa dinamicidade às
mudanças que ocorrem no processo produtivo, a partir da crescente incorporação
de ciência e tecnologia, em busca de competitividade. A descoberta de novos
princípios científicos permite a criação de novos materiais e equipamentos; os
processos de trabalho de base rígida vão sendo substituídos pelos de base
flexível; a eletromecânica, com suas alternativas de solução bem definidas, vai
cedendo lugar à microeletrônica, que assegura amplo espectro de soluções
possíveis desde que a ciência e a tecnologia, antes incorporadas aos
equipamentos, passem a ser domínio dos trabalhadores; os sistemas de comunicação
interligam o mundo da produção.
O novo discurso refere-se a um trabalhador de novo tipo, para todos os
setores da economia, com capacidades intelectuais que lhe permita adaptar-se à
produção flexível. Dentre elas, algumas merecem destaque: a capacidade de
comunicar-se adequadamente, por intermédio do domínio dos códigos e linguagens,
incorporando, além da língua portuguesa, a língua estrangeira e as novas formas
trazidas pela semiótica; a autonomia intelectual, para resolver problemas
práticos utilizando os conhecimentos científicos, buscando aperfeiçoar-se
continuamente; a autonomia moral, por meio da capacidade de enfrentar novas
situações que exigem posicionamento ético; finalmente, a capacidade de
comprometer-se com o trabalho, entendido em sua forma mais ampla de construção
do homem e da sociedade, por meio da responsabilidade, da crítica, da
criatividade. Evidentemente, esses novas determinações mudariam radicalmente o
eixo da formação de trabalhadores, caso ela fosse assegurada para todos, o que
na realidade não ocorre. Ao contrário, as pesquisas que vêm sendo desenvolvidas
nessa área reforçam cada vez mais a tese da polarização das competências, por
meio da oferta de oportunidades de sólida educação científico tecnológica para
um número cada vez menor de trabalhadores incluídos, criando estratificação,
inclusive entre estes.
Parece haver contradição quando se verifica que os trabalhadores dos
setores menos automatizados têm que se utilizar de conhecimentos e destrezas
especificas, tendo o primeiro grau completo como requisito, enquanto os que
trabalham nos setores mais automatizados e apenas alimentam/vigiam as máquinas,
controlando a existência de problemas por meio de mensagens emitidas na tela do
computador, para o que se exige apenas a memorização das teclas a serem
acionadas sempre que tal situação ocorre, exige-se como requisito, segundo grau
completo.
Neste sentido, o trabalho escolar, além de supostamente selecionar os
“mais capazes”, desenvolve habilidades cognitivas, hábitos e condutas que
facilitam o enfrentamento de situações dinâmicas com a necessária flexibilidade
Nesta perspectiva justifica-se o discurso do capital quando defende
patamares mais elevados de educação para os trabalhadores, porque mesmo a
concepção de qualificação profissional presente nesta etapa privilegia a
capacidade potencial para resolver situações-problema decorrentes de processos
de trabalho flexíveis em substituição às competências e habilidades especificas
exigidas para o exercício das tarefas nas organizações tayloristas/fordistas, e
isto exige o domínio dos conhecimentos científicos e tecnológicos das
diferentes áreas para a viabilização dos programas de qualidade, um dos pilares
da nova estratégia de acumulação..
A pesquisa realiza permitiu identificar significativas transformações com
relação à dimensão metodológica. A necessidade de definição de procedimentos
metodológicos que permitem superar a memorização, tornando-se como habilidade
cognitiva fundamental a capacidade de localizar informações e trabalhar
produtiva e criativamente com elas na construção de soluções para os problemas
postos pela dinâmica da pratica social e produtiva;
As praticas pedagógicas fundamentais da absorção passiva deverão ser
substituídas pela relação ativa e intensa entre o educando e o conhecimento por
meio da ação mediadora do professor, que organizará significativas experiências
de aprendizagem. Finalmente, tomando a concepção de qualificação não como um
atributo social, mas como um processo histórico resultante da articulação de
múltiplos fatores, há que se tomar como ponto de partida para o desenvolvimento
do processo pedagógico, o conhecimento e as concepções que o aluno/trabalhador
acumulou no transcurso de sua experiência de vida, de educação e de trabalho
(saber tácito).
A pesquisa evidenciou fundamental mudança de eixo dos espaços e atores
pedagógicos, com relação às formas tayloritas/fordistas de organização do
trabalho.
Até o final dos anos 80, o espaço pedagógico dominante era a área de
relações humanas, articulada a supervisores de linha que exerciam funções de
controle administrativo e de concepção, estes eram os verdadeiros educadores,
imbuídos de manter a concepção de trabalho.
O espaço de aprendizagem, mais do que nunca, passou a ser o piso de
fabrica, onde ciência e trabalho constroem uma nova unidade e onde se
estabelece outros tipos de relações sociais, agora determinadas pelas células
de produção, mini-fábricas ou outras formas. O aprendizado coletivo, em face
das situações-problema, com o aporte científico-tecnológico do engenheiro, à
luz dos paradigmas da qualidade passa a ser a forma dominante. A primeira delas
respeito à constatação da vertiginosa ampliação dos espaços pedagógicos
propiciados pelo avanço cientifico e tecnológico em todas as áreas, reduzindo
os espaços e tempos nas comunicações, agora online e permitindo o acesso
imediato a qualquer tipo de informação pelos mais diversos meios.
Este processo se da não mais exclusivamente na dimensão individual, mas
por meio de relações que são sociais e, portanto, articulam as dimensões
individual e coletiva, subjetiva e objetiva, teórica e prática, que caracteriza
o trabalho humano enquanto categoria fundante dos processos de produção do
conhecimento.
Com relação ao controle, a pesquisa evidenciou provavelmente ser esta a
categoria que passou pelas mais profundas transformações, na medida em que as
formas substituídas por formas internalizadas.
Neste novo contexto, o saber do trabalhador passa a ser estratégico para
o aumento da produtividade, definindo-se a necessidade do investimento na
ampliação de seus conhecimentos. A necessidade de a escola investir na formação
da consciência crítica por intermédio dos novos conteúdos, métodos, espaços e
atores pedagógicos, incorporando novas sistemáticas de avaliação.
As novas formas de organização do trabalhador substituem a tradicional
linha onde cada um era responsável pelo seu posto; a produção individual dá
lugar à produção coletiva a partir de novas combinações entre trabalho humano e
máquinas.
o pleno domínio da lógica capitalista a partir da qual construirse- á uma
sociedade cada vez mais violenta, miserável, destruidora e desumana. Resta
saber como a escola pode enfrentar esta realidade, e se é capaz de fazê-lo.
Considerar as novas formas de controle e criar novos comportamentos que
fortaleçam o coletivo é um desafio que se impõe, se mantida a concepção de uma
escola regida pela utopia da construção de uma sociedade mais justa e
igualitária.
A primeira contradição é a que ocorre entre o discurso e a prática da ampliação
generalizada da educação básica, fundamento necessário para uma sólida formação
profissional.
Com o Brasil não é diferente. Atravessado por uma profunda crise economia
e institucional, o governo adota um conjunto de políticas, definidas pelo Banco
Mundial como sendo para os países pobres, que têm profundos e negativos
impactos sobre a educação.
Em consonância com a progressiva redução do emprego formal e com a
crescente exclusão, o investimento em educação passa a ser definido a partir da
compreensão de que o Estado só pode arcar com as despesas que resultem em
retorno econômico. Desta forma, o compromisso do Estado com a educação pública
obrigatória e gratuita mentem-se no limite do ensino fundamental.
Em absoluta concordância com as transformações ocorridas no mundo do
trabalho, as política públicas de educação objetivam a contenção do acesso aos
níveis mais elevados de ensino para os poucos incluídos respondendo à lógica da
polarização. Estas políticas são orgânicas a um mercado de trabalho cada vez
mais restrito, obedecendo-se portanto, à lógica capitalista da racionalidade
financeira.
A nova pedagogia do trabalho, como se buscou analisar, é perpassada pelas
profundas contradições que marcam a relação entre capital e trabalho. As
políticas educacionais vigentes, ao optar pelo atendimento às demandas do
capital, viabilizam as positividades decorrentes dessa nova etapa para um grupo
restrito de trabalhadores, que vão desempenhar as atribuições de
dirigentes/especialistas, responsáveis pelas funções de gestão, manutenção e
criação.
O nosso desejo, reconhecidamente ingênuo, tem como objeto uma escola que,
comprometida com os trabalhadores e os excluídos, para além das políticas
educacionais restritivas, pudesse tomar como referencia as positividades presentes
nas mudanças que ocorrem no mundo do trabalho para construir um novo projeto
pedagógico, o qual, rompendo com a lógica da racionalidade financeira, formasse
os cidadãos de novo tipo, intelectual, técnica e eticamente desenvolvidos e
politicamente comprometidos com a construção da nova sociedade.
REFERENCIA
KUENZER, Acácia
Zeneida, As Mudanças no Mundo do Trabalho e a Educação: Novos Desafios para a
Gestão. Gestão Democrática da Educação: atuais tendências, novos desafios. 6
ed. São Paulo: Cortez 2008 p.33-57
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Ser professor é ter o nobre ofício de exercer a arte de ensinar.