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quarta-feira, 5 de agosto de 2015

PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO

A Psicologia da Educação procura utilizar os princípios e as  informações  que as pesquisas psicológicas oferecem acerca do comportamento humano, para tornar mais eficiente o processo ensino- aprendizagem..
A contribuição da Psicologia da Educação abrange dois aspectos fundamentais: 

a)    Compreensão do aluno. Compreensão de suas necessidades, suas características individuais e seu desenvolvimento, nos aspectos físico, emocional, intelectual e social. O aluno não é um ser ideal, absoluto.  É uma pessoa concreta, com preocupações e problemas, defeitos e qualidades. É um ser em formação, que precisa ser compreendido pelo professor e pelos demais profissionais da escola, a fim de que tenha condições de desenvolver-se de forma harmoniosa e equilibrada.

b)Compreensão do processo ensino-aprendizagem. Para o professor, não é suficiente conhecer o aluno. É necessário que ele saiba como funciona o processo de aprendizagem, quais os fatores que facilitam ou prejudicam a aprendizagem, como o aluno  pode aprender de maneira mais eficiente, além de outros aspectos ligados  à situação de aprendizagem, envolvendo o aluno, o professor e a sala de aula.
Na verdade, além desses dois aspectos existe outro, de fundamental importância para que o professor consiga realizar satisfatoriamente seu trabalho: a compreensão do papel do professor.



1.1 – COMPREENSÃO DO PAPEL DO PROFESSOR

A idéia que fazemos de escola quase  sempre inclui o seguinte quadro: um professor tentando ensinar  alguma coisa a uma turma de alunos. Na verdade, o professor também aprende enquanto ensina, e o aluno, enquanto aprende, também ensina. Se o professor precisa conhecer a si mesmo para poder conhecer os alunos, a  abertura ao que os alunos podem  ensinar-lhe  é um dos passos para esse autoconhecimento.
O professor não é o senhor absoluto, dono da verdade e dono dos alunos, que manipula a seu bel-prazer. Os alunos são pessoas humanas, tanto quanto ele, e seu desenvolvimento e sua liberdade de manifestação precisam ser respeitados pelo professor.  Na medida em que isso acontecer, o professor chegará a conclusão de que não é apenas uma maquininha  de ensinar  ou um gravador ou qualquer outro aparelho. Como os alunos, ele também é uma pessoa e relaciona-se com eles de forma global, e não apenas como  instrutor ou transmissor de ordens e conhecimentos.
Enquanto pessoa humana adulta , o professor costuma ser considerado um exemplo para os alunos. Quase sempre sem ter consciência exata disso, o professor  transmite a seus alunos atitudes positivas ou negativas em relação ao estudo e aos colegas, transmite seus preconceitos, suas crenças, seus valores, etc. O aluno às vezes aprende muito mais com o que o  professor faz ou deixa de fazer, do que com aquilo que o professor diz. É importante que o professor tenha consciência de que além de mero transmissor de conhecimentos, ele é mais um dos exemplos adultos que os alunos em desenvolvimento poderão vir a imitar.
Ao menos em relação a crianças, certas pesquisas têm demonstrado que o conhecimento de matéria e a eficiência  do ensino não   são  mais   valorizadas   pelos   alunos.  Mas   importante   é   o relacionamento do professor com as crianças, do ponto de vista do indivíduo e do grupo. Professores que mantêm relações agradáveis com os alunos, que preferem atitudes democráticas e cooperadoras, que são delicados e paciente, têm muito mais probabilidades de serem bem sucedidos em seu trabalho educativo.
Outro aspecto importante do papel de professor refere-se à sua participação em atividades escolares extraclasse. Essas atividades são responsáveis por grande parte da aprendizagem dos alunos: é no recreio, em promoções culturais, artísticas, sociais e  esportivas que os alunos aprendem a convivência social, o gosto pela cultura e pela arte e a prática de esportes, tão salutares para seu desenvolvimento. O professor deveria participar dessas atividades que contribuem para uma melhor aprendizagem das matérias escolares. Essa participação proporcionaria ao professor oportunidades ótimas de conhecer melhor seus alunos.
É sabido que o relacionamento fora da sala  de aula, em atividades extraclasse,  costuma ser muito natural e espontâneo e,  por tanto, muito mais rico para o desenvolvimento integral de alunos e professores.
A participação do professor em atividades da comunidade onde se situa a escola também é importante para que ele conheça os resultados de seu trabalho e possa orientar as tarefas escolares de acordo com as necessidades e aspirações  reais da população. Muitas vezes a escola permanece isolada da comunidade, quando deveria estar a seu serviço, atendendo aos pais e a outros moradores da comunidade, como centro de encontros, reuniões, cursos e promoções artísticas, culturais, esportivas, etc.
Além dos aspectos relacionados com vários papéis que o professor desempenha junto  aos alunos e a comunidade, convém chamar a atenção para a própria  realização do professor.  Para o sucesso  do  trabalho  educativo, é  importante  que  o professor goste do que faz, acredite que está alcançando os resultados esperados e se sinta satisfeito e realizado. Um professor frustrado é um fator de frustração para os alunos. Sabe-se que uma atitude positiva do professor em relação à matéria, aos alunos e a seu próprio trabalho é de fundamental importância para a eficiência da aprendizagem por parte dos alunos.
Na medida em que se sente realizado, o professor tem  interesse em evoluir constantemente, em procurar dedicar-se efetivamente a seu trabalho. Quanto mais o professor se aperfeiçoa, tanto mais alcança sucesso em seu trabalho, e quanto mais se vê bem sucedido, tanto mais procura aperfeiçoar-se e desenvolver-se.
É evidente que a realização do professor, enquanto instrutor, orientador e exemplo, enquanto participante das atividades de seus alunos e da comunidade, depende também das condições objetivas de trabalho. Se o professor ganha pouco e seu dinheiro não dá nem para comprar um livro ou ir a um teatro; se a escola não lhe oferece os recursos necessários a seu trabalho educativo,  dificilmente ele poderá contribuir para a realização dos alunos. Nessas condições, será um herói aquele que conseguir aperfeiçoar-se constantemente e realizar-se.
A população  e os professores devem trabalhar para que os poderes públicos tomem consciência da importância da educação para o país e canalizem para o setor os recursos necessários.

1.2 – COMPREENSÃO DO ALUNO

A Psicologia da Educação é indispensável para que o professor tenha condições de compreender seus alunos e desenvolver um trabalho eficiente.
Não é a mesma  coisa  trabalhar com crianças de quatro anos, com  crianças    de  dez anos ou com adolescentes. O aluno está em   formação,  em  desenvolvimento. E  em  cada  uma  das   etapas desse desenvolvimento tem características diferentes, necessidades diferentes, maneiras diferentes de entender as coisas. Daí a importância  que tem para o professor o conhecimento integral do aluno, em seus aspectos físico, emocional, intelectual e social.
A  escola geralmente dá mais importância ao desenvolvimento intelectual  do que aos outros aspectos. Mas, principalmente em regiões desfavorecidas, cabe à escola suprir as deficiências da comunidade e contribuir para o desenvolvimento físico, emocional e social dos alunos. Isto é importante na medida em que o desenvolvimento humano se faz de forma integral e global, envolvendo todos os aspectos. O desenvolvimento intelectual poderá ser prejudicado, se não houver o desenvolvimento concomitante dos outros aspectos.
Além dos conhecimentos ligados ao desenvolvimento efetivo e intelectual dos alunos, a Psicologia da Educação pode ajudar o professor a compreender os alunos em suas relações com a família, com os amigos, com a escola, com a comunidade, etc. No decorrer de sua vida diária, o aluno sofre uma série de influências que vão ter repercussões, negativas ou positivas, em seu trabalho escolar. Se essas influências estão em concordância com a direção imprimida ao trabalho escolar, podem ser benéficas para a aprendizagem.
Em alguns casos, verifica-se que a família e a escola orientam a criança em sentidos diferentes, ou que os valores dos amigos e os da escola sejam valores divergentes. Haverá então conflitos, e a criança poderá ser prejudicada em seu trabalho escola.
  Conflitos podem nascer  também das diferenças de classes sociais. Muitos alunos já chegam a escola familiarizados com o material escolar  comum – lápis, borracha, régua,  caderno,   livro- enquanto outros nunca usaram esse material em sua vida. Muitos alunos chegam imbuídos de valores como  ordem,  limpeza,  higiene, trabalho persistente, etc., ao passo que outros não estão acostumados a dar importância  a tais valores. O que acontece, então?
Na medida em que o professor é oriundo de uma determinada classe social, pode não levar   em  consideração tais diferenças e revelar dois comportamentos negativos:
1.°desconhecer que o não-aproveitamento dos alunos pode ser conseqüência da inadaptação à própria  escola;
2.°tentar impor seus próprios valores de classe a todos os alunos, desrespeitando a realidade de cada um.
Como se vê, o trabalho educativo não é tão simples quanto se possa imaginar. Embora o conhecimento da Psicologia da Educação não seja garantia de bom ensino, pode ajudar o professor a desempenhar suas funções de maneira mais satisfatória para ele e para os alunos.




1.3 – COMPREENSÃO DO PROCESSO ENSINO-APRENDIZAGEM

Entre os professores muitas idéias falsas sobre o processo educativo já  estão sendo substituídas por outras. Hoje em dia sabe-se que não basta punir ou recompensar o aluno para que ele aprenda; que despejar conhecimentos sobre os alunos não é o mais importante; que apenas falar a matéria na aula é insuficiente; que não basta que o aluno memorize os conhecimentos para que os utilize na prática; que não adianta criar uma situação agradável na sala de aula, se o aluno não está interessado em aprender, etc.
A aprendizagem ocorre sob a ação de inúmeros fatores, que a Psicologia da Educação procura estudar e explicar. Às vezes,   o  aluno  não  aprende por  razões simples, como, por exemplo, o fato de ter ficado em casa por causa da chuva, ou o fato de os pais não darem importância a escola, e assim por diante.
Por tudo isso é muito importante que o professor estude as principais questões analisadas pela Psicologia da Educação:
·           O que é aprendizagem ?
·           Quais os fatores que facilitam a aprendizagem?
·               Como deve ser a interação entre professor e alunos para que a aprendizagem seja mais eficiente ?
·      Como fazer com que os alunos estejam motivados para aprender e se interessem pela matéria a ser estudada ?
·    Como fazer para tornar a matéria e o seu ensino mais criativos, mais dinâmicos, e menos monótonos ?
·    Qual a importância  da liberdade  para  a aprendizagem ?
·               Porque os alunos esquecem a maior parte do que estudam ?
·               Como não esquecer o que aprendemos ?
·               Quais os fatores que prejudicam a aprendizagem ?
·               O que significa avaliar a aprendizagem ?
·               Como avaliar o que foi aprendido ?
A todas essas questões  e a muitas outras a Psicologia da Educação procura responder. Entretanto, é preciso que se tenha sempre em mente o seguinte: cada situação é diferente, cada caso é um caso. A  Psicologia da Educação  não fornece receitas prontas, que o professor possa aplicar automaticamente. Diante de cada situação, o professor possa aplicar e estudar todos os aspectos e, somente então, ver qual o procedimento indicado para o caso.  As informações sobre o comportamento oferecidas pela Psicologia podem ajudar o trabalho do professor.

2. A FAMÍLIA DO ALUNO

O aluno vive numa família que tem pai, mãe e irmãos? Vive só com a mãe e os irmãos? Vive só com os pais? Vive com irmãos, sem pai nem mãe? Vive com um tio, uma tia, os avós? Quantos irmãos tem? Como são seus pais? São autoritários? Mandões? Agressivos e violentos? Ou dão total liberdade? São afetuosos com os filhos? Os pais trabalham? Estão desempregados? Ganham o suficiente para sustentar a família? Passam por dificuldades? Os filhos se alimentam bem ou mal? Os pais valorizam a escola? Ou preferem que o filho deixe de estudar para trabalhar?
Todas as questões acima mostram como pode variar a situação familiar do aluno, situação que sempre guarda alguma relação com a vida na escola.
O professor não pode esquecer que o aluno aprendeu muita coisa antes de entrar para a escola e que continua aprendendo muita coisa  fora da escola. Portanto, o que o professor ensina não é a única  influência que o aluno recebe nem a mais importante. Fora da escola, ele aprende muita coisa importante para  sua própria aprendizagem   na escola, importante para a formação da sua personalidade, importante para toda a sua vida.
Fora da escola podemos encontrar três tipos de influências importantes que atingem o aluno: a família, os amigos e a comunidade. Neste capítulo, analisaremos as influências da família, abrangendo quatro pontos principais: família e aprendizagem, família e personalidade, ambiente familiar e família e classe social.

2.1 – FAMÍLIA E APRENDIZAGEM

As principais experiências educacionais da criança geralmente são proporcionadas pela família. Depois de nascer, a criança começa a sofrer influências familiares que, aos poucos, vão modelando seu comportamento: a roupa que deve vestir, a alimentação que deve tomar em determinados horários, as horas em que deve dormir. Mais tarde, é o treino para que ande, para que fale, para que não faça xixi na roupa, etc.
Provavelmente, a maior parte das influências que os pais exercem sobre os filhos é inconsciente.  Muitos pais não têm plena consciência de que seus comportamentos, sua  maneira de ser e de olhar para os outros, e até mesmo sua maneira de carregar o filho no colo, tem enorme influência sobre o desenvolvimento do filho.
É preciso considerar que o treino a que os pais submetem as crianças, de maneira consciente e deliberada, nem sempre produz os resultados esperados. Além disso, certos treinos produzem  resultados com os quais os pais nem sonham. Vejamos um exemplo esclarecedor contado por Lindgren. (Op. Cit.,p. 85.)
“Dona Léa começou a treinar o controle dos esfíncteres de seu filho José quando ele tinha seis semanas de idade. Sempre que pensava estar ele a ponto de urinar ou defecar, colocava-o na privada. Sempre que ele sujava a fralda, ela o repreendia; sempre que ele urinava ou defecava na privada, ela o gratificava. Isto aconteceu meses após meses. Gradualmente, José se sujava menos freqüentemente
Sua mãe estava  satisfeita com esse progresso, embora desejasse  que ele aprendesse sempre mais depressa. Então, ela o repreendia mais severamente e ocasionalmente batia nele quando ele sujava a fralda. Finalmente,  quando  ele  estava  com   dezoito meses,  começou  a usar  a  privada   quase   todas   as   vezes       para   o movimento do intestino, mas  seu  treino  da bexiga  só ficou completo quando atingiu dois anos. Quando isso aconteceu, Dona Léa congratulou-se por ter feito um trabalho tão completo de treinamento dos esfíncteres de seu filho”.
Na verdade, o que Dona Léa deveria fazer era dar-se os pêsames. Todo tempo que perdeu procurando treinar seu filho, a partir de seis semanas de idade, foi inútil, pois a maioria das crianças só tem condições de estabelecer o controle dos intestinos por volta dos dezoito meses e o da bexiga, por volta dos dois anos. O treinamento precoce, antecipado, só pode trazer resultados prejudiciais. Quem  aprendeu com todo trabalho foi Dona Léa __aprendeu os horários em que José costumava defecar e urinar, colocando-o na privada na hora certa. Quando  o intestino e a bexiga mudavam de horário, o treino ia por água abaixo!
E José não aprendeu nada com toda essa preocupação da mãe? Claro que aprendeu! Pode não ter aprendido a controlar os esfíncteres, mas aprendeu uma porção de outras coisas: que sua mãe estava ansiosa, que sua mãe estava desapontada com ele, que sua mãe estava sempre agitada e indecisa. Na verdade, Dona Léa pensava estar ensinando hábitos de eliminação, mas ensinava atitudes de valores quanto à eliminação, à sujeira, a horários e à vida em geral.
O que é ensinado inconscientemente, sem a intenção de ensinar, normalmente permanece por mais tempo. Embora você tenha esquecido muito das matérias que aprendeu na escola, certamente se lembra de muita coisa a respeito de seus professores, de como agiam, de sua maneira de tratar os alunos, etc.
Os sentimentos que os pais têm em relação à criança, durante os anos anteriores à escola, são de fundamental importância  para  o   desenvolvimento posterior da criança e para sua aprendizagem escolar. Esses sentimentos contribuem para que a criança  desenvolva  o  conceito  de  si  própria  (o  autoconceito ),  o conceito do mundo e de seu lugar  no mundo. E já vimos que o autoconceito é a base de toda a aprendizagem: se a criança se julga capaz de aprender, aprenderá muito mais do que a criança que acha que é incapaz.
Parte da influencia dos pais provém da maneira como eles encaram a  aprendizagem escolar. No caso da leitura, por exemplo, os pais podem estranhar o atraso do filho nessa atividade. Podem pensar consigo mesmos: “ Mas como? Se sempre estimulei nosso filho para que lesse? Chegamos até a comprar livrinhos de histórias para ele. Não é possível! Ele deve ter algum problema!” .
Na verdade, o atraso do filho pode estar relacionado com a atividade dos pais em relação à leitura. Não basta comprar livros e dizer ao filho que leia. A pergunta fundamental é o seguinte: Os pais lêem? Se não lêem o filho não aprendeu em casa uma atitude positiva em relação à leitura. Certos pais preferem ver televisão, assistir algum filme, passear. Com tais exemplos o filho não terá muito interesse em leitura.
Poderíamos citar outros exemplos. Mas, os exemplos mencionados mostram claramente como os pais podem influenciar a aprendizagem que os filhos vão ter na escola: através de atitudes e valores que passam aos filhos, sem a intenção de ensinar.

2.2 – FAMÍLIA E PERSONALIDADE

Vimos, no capítulo anterior, que o indivíduo estrutura sua personalidade a partir do final da infância, quando já pode ter seu próprio sistema de normas e valores que vai ser estabelecido com base nas experiências infantis, entre as quais uma das mais importantes é o clima psicológico que os pais propiciaram á criança. Geralmente, as atitudes básicas em relação à vida, assimiladas na infância, continuam durante toda a vida.
Um exemplo contado por Lidgren ajudará a esclarecer a questão da influência dos pais.
“Na família Silveira, o ditado “  As crianças pequenas devem ser vistas e não ouvidas” foi posto de lado. Quando Mário era um bebê, seus irmãos e irmãs dominavam a conversação à mesa de jantar e, quando ele cresceu o suficiente para participar da conversa, acrescentou sua voz à dos outros. Os pais de Mário às vezes faziam objeções  quanto ao barulho, dizendo que o jantar deveria ser um acontecimento calmo, um momento para conhecer o pensamento uns dos outros. Mas nunca fizeram uma tentativa séria para impor silêncio, porque sentiam que era ainda mais importante que as crianças pudessem falar. Quando os filhos atingiram a adolescência e a idade adulta, continuaram a ser indivíduos francos. O próprio  Mário teve poucos problemas com a timidez, tão comum durante a adolescência  e a idade adulta, e animadamente dominava as reuniões e discussões de classe no ginásio e na faculdade. Por outro lado, os mais velhos freqüentemente se queixavam de que ele não tinha o necessário respeito por pessoas que ocupavam posições de importância e autoridade. Dentre seus professores, aqueles que adotavam a discussão em classe gostavam de sua presença na aula, porque sempre se podia contar com ele para manter uma discussão. Os professores que empregavam o método expositivo consideravam-no passível de censuras, porque ele tinha o hábito de interrompê-los com perguntas e comentários.”
O exemplo permite perceber como as atitudes dos pais em relação aos filhos, à mesa, na hora do jantar, influenciam a maneira de ser dos filhos, em relação às outras pessoas.
Na verdade, existem  muitos outros aspectos, além da maneira de se relacionar com os outros, que tornam as pessoas diferentes umas das outras. Mas, todos esses aspectos são também influenciados pelo ambiente familiar, nos primeiros anos de vida.
Já vimos como a hereditariedade e o ambiente influenciam nosso desenvolvimento: cada um organiza de uma maneira especial, diferente dos outros, o que recebe de hereditário e o que aprende a partir do nascimento. Por isso, mesmo dois filhos que recebem a mesma influência familiar, às vezes podem desenvolver personalidades diferentes, maneiras diferentes de ser. Isto acontece porque as influências familiares são interpretadas de uma maneira particular e outras influências, fora da família, também contribuem para a formação da personalidade.
De qualquer forma, há certas maneiras características de os pais se comportarem, e essas maneiras têm influências diferentes sobre os filhos. Quanto ao tratamento, os pais podem ser restritivos, controladores, manter os filhos “com rédea curta”; mas podem também ser permissivos, liberais, permitir que os filhos façam o que bem entendem.
Quanto ao relacionamento afetivo, podem ser afetuosos, carinhosos; mas, podem ser hostis, severos, agressivos, violentos. Das diferentes combinações dessas quatro características – restritivos  ou permissivos e afetuosos ou hostis – resultam diferentes influências sobre os filhos, que podem desenvolver diferentes personalidades. Veja no quadro que segue a esquematização dessas influências e dos resultados que podem ter sobre os filhos.

Pais
Tratamento restritivo
Tratamento permissivo





·         Submisso, dependente, polido, asseado, obediente, não amigável, não criador.

·         Ativo, desinibido, criador ,bem sucedido, independente, amigável.

Afetuosos
·         Agressão mínima, submissão máxima.
·         Mínima submissão, auto-agressão mínima

Hostis
·         Tímido, afastado socialmente, problemas neuróticos.
·         Auto-agressão máxima.
·         Não condescendente, intransigente, delinqüência.
·         Agressão máxima.

Esquematizando ainda mais o quadro, poderíamos ter as quatro situações que seguem:
1ª) Pais restritivos e afetuosos: filhos submissos e dependentes.
2ª) Pais restritivos e hostis: filhos tímidos e auto-agressivos.
3ª)  Pais permissivos e afetuosos:  filhos criadores e independentes.
4ª)  Pais permissivos e hostis: filhos intransigentes e agressivos.
É evidente que não se trata de uma fórmula rígida, de aplicação automática: além dos pais, outras influências podem atuar fortemente sobre a criança em desenvolvimento.

2.3 – O AMOR NO AMBIENTE FAMILIAR

              O amor dos pais ou de outros adultos é uma condição indispensável  para a educação das crianças. Quando os pais amam os filhos, estes desenvolvem atitudes positivas em relação a si mesmos, aos outros e a vida. Os filhos aprendem a amar,  verdadeiramente. Amar a si mesmos, amar  aos  outros,  amar  a vida. Não basta falar que se ama. Criança nenhuma se deixa enganar pelas palavras “meu bem, meu querido”, Não adianta disfarçar, porque as crianças percebem.
Os pais que se amam tendem a amar também os filhos. Estes se sentem confiantes, seguros, amantes da vida. Amar não significa dar liberdade absoluta. Existem limites para a ação individual, limites estabelecidos pelas ações dos outros. Isto é: eu sou livre, mas o outro também é livre; se vivemos juntos, devemos estabelecer conjuntamente as regras da nossa convivência.
Na escola, as crianças bem amadas geralmente são participantes, interessadas, procuram entender o que está acontecendo, são entusiasmadas com as atividades que acham interessantes e úteis. Em termos de convivência social, geralmente são respeitadoras dos outros, mas têm seus pontos de vista, que defendem e procuram difundir.
Quando a criança vive com pais que não se amam e não as amam, o resultado pode ser catastrófico: os problemas dos pais, suas atitudes negativas diante da vida e dos outros passarão para os filhos.
Na escola, a situação será difícil: alunos não amados tendem a não ter confiança em si mesmos e nos outros; nas atividades em conjunto, geralmente não colaboram; desenvolvem comportamentos agressivos, como uma defesa contra a falta de amor. São crianças que podem apresentar pouco entusiasmo com as atividades escolares, desinteresse, revolta, fuga de uma relação amorosa e construtiva.
Muitas vezes, é preferível que os pais se separem a ficarem junto sem amor. A criança filha de pais separados pode encontrar uma nova situação mais favorável: ou a mãe se casa de novo e o novo casal criará uma situação de amor entre eles; ou se encontra outro adulto, que substitua seus pais naturais, etc.
Convém considerar que as situações familiares variam muito e que o comportamento humano é complexo e cada um estabelece os próprios padrões de conduta. Na relação professor-aluno,  o essencial é compreender o comportamento da criança. E compreender que não são apenas os pais que influenciam esse comportamento.  É preciso que o professor analise o comportamento, veja os fatores que estão interferindo e, na medida do possível, tente agir sobre  esses fatores. Não se pode tentar corrigir apenas o efeito, o comportamento manifesto, sem analisar suas causas. Também não se pode, diante de uma situação considerada anormal -  falta de amor dos pais,  pais agressivos - ,atribuir apenas a esta situação a responsabilidade pelo comportamento da criança. E lembrar-se de que compreender é preferível a julgar.
Alguns educadores, no entanto, parecem dar importância exagerada a certas influências dos pais. Veja os exemplos citados por Neill (Op. Cit.,p.301):
“Tive entre outros, os seguintes casos:
Menina de quinze anos, ladra. Mãe infiel ao pai. A menina sabia.
Menina de catorze anos sonhadora infeliz. A neurose datava do dia em que viu o pai com sua amante.
Menina de doze anos, odiava todo mundo. Pai impotente, mãe azeda.
Menino de oito anos, ladrão. Pai e mãe brigavam abertamente.
Menina de nove anos, vivia no mundo da fantasia (em grande parte anal-erótica). Pais furtivamente hostis um contra o outro.
Menino de nove anos, impossível em casa devido ao mau gênio vivendo em fantasia de grandeza. Mãe malcasada .
Compreendendo quanto é difícil curar uma criança quando o lar permanece um lugar destituído de amor. Muitas vezes respondo à mãe que me pergunta o que deve fazer com o filho:
- Vá  fazer a senhora uma análise psíquica”.

2.4 – FAMÍLIA E CLASSE SOCIAL

Falamos da situação afetiva da família, onde pode existir ou faltar o amor. Trataremos agora da situação material.
A maior parte da população brasileira pertencente à classe daqueles que auferem rendimentos muito baixos. Geralmente as famílias enfrentam enormes dificuldades. As crianças que não morrem no primeiro ano de vida passam fome ou se alimentam mal. Como vai ser seu rendimento na escola? Baixo? Nem poderia ser diferente. Em conseqüência, as crianças dessas famílias tendem a se afastar da escola. Vão sentir-se incapazes, frustradas e continuar a situação dos pais: trabalhar para ganhar muito pouco.
Outro aspecto importante, quando se considera a relação entre classe social e escola, é que a escola, geralmente, é feita para crianças que já vivem num clima favorável à aprendizagem. Veja o seguinte: um filho de classe média ou alta já tem em casa uma série de experiências com materiais escolares  - lápis,  papel, caderno, livro, etc. - , que o familiarizam com a atividade escolar. Por outro lado, a criança de classe média ou alta muitas vezes freqüenta  a   pré-escola, ou seja, vai à escola desde os dois ou três anos.  No primeiro ano do primeiro grau, essa criança vai se sair melhor do que aquelas que nunca viram uma caneta, nunca manipularam um  livro, etc. A conclusão que se pode tirar é que não é competência individual que vai selecionar os melhores para prosseguirem os estudos, mas a classe social a que pertencem. Esta tem muita influência sobre a aprendizagem escolar. Esse é um assunto tratado especialmente em Sociologia  da Educação.

A AVENTURA ESCOLAR

A maioria das crianças que vive  nas condições descritas no capítulo anterior consegue entrar na escola. Mas a escola vai se transformar numa aventura arriscada e noventa crianças em cada cem não vão conseguir chegar ao fim dessa  aventura. As estatísticas mostram que apenas l0% dos que começam o primeiro grau, conseguem se matricular na primeira série do segundo grau.
O que acontece no decorrer do primeiro grau? Conversando com antigos colegas seus, que entraram com você na escola, mas que atualmente não continuam estudando, você poderá ter uma idéia a respeito do que foi a escola para ele, por que não continuaram , etc.
Você mesmo, depois de dez anos ou mais de bancos escolares, pode falar a respeito dessa aventura: como foi?  quais os fatos mais marcantes? o que sobrou dela? Valeu a pena? Ninguém melhor do que aqueles que viveram esta aventura, durante milhares de dias, para falar a respeito dela.
Neste capítulo, procuraremos contar um pouco dessa aventura, da maneira como a vemos atualmente. Você não precisa , necessariamente, concordar com tudo que vai ser dito. Cada caso é um caso e aquilo que vai ser dito aqui pode não se aplicar a todos os casos. De qualquer forma, é uma oportunidade de pensar sobre a aventura escolar.
Três pontos principais serão estudados:   o que as crianças encontram na escola; a reação das crianças e o que fazer?

·          O QUE A CRIANÇA ENCONTRA NA ESCOLA

De acordo  com Babette Harper e outros (Op. Cit., p. 40 e seguintes), a criança ao chegar à escola, vai encontrar uma realidade totalmente diferente da sua, um mundo desconhecido e estranho. Os principais aspectos desse novo mundo seriam os seguintes:
1.º)  “Um mundo à parte, fechado e protegido, onde a criança  é depositada como um pacote registrado, cujo acesso é cuidadosamente controlado.” Você já reparou que a maioria das escolas é cercada por altos muros? O portão é rigorosamente vigiado: Pessoas estranhas não entram! Mas como pode existir pessoas estranhas à escola? Por que a escola deve estar isolada?  Por que a criança, ao entrar na escola, deve cortar suas ligações com o mundo exterior? Pais, mães e comunidades devem fazer parte integrante da escola.
2.º) Um mundo “separado da vida”. Como é rica e variável a vida da criança, fora da escola! São muitas experiências diferentes, ricas em todos os sentidos: na rua, a criança encontra pessoas diferentes, animais, plantas, sol, chuva, etc. Na escola, cria-se um ambiente artificial e uniforme: uma sala, carteiras, quadro-negro, giz, professor e, geralmente, mais nada.
3.º) Um mundo de ritos imutáveis”.  Todos os dias a mesma coisa; em todas as aulas a repetição monótona de todas as outras aulas, das do dia anterior, etc. Nada de novo, de diferente, de interessante. Uma escola assim é percebida pelas crianças como algo muito aborrecido, que é preciso suportar, um remédio amargo que precisa ser tomado. Uns poucos conseguem suportar essa escola; a grande maioria desiste.
4.º) “Um mundo de silêncio e imobilidade”. Há escolas que  ainda  obrigam  as  crianças  a  entrarem  em  fila,  uma  atrás da outra, em silêncio. Na sala, não se permite que a criança se levante, converse, olhe para o lado. Felizmente, o sonho é livre e, enquanto “ouve” a criança  dá asas à imaginação.
5.º)  Um mundo  “onde os papéis de cada um estão previamente determinados”. O aluno deve calar, escutar, obedecer, ser atento, disciplinado e dócil. O que é o bom aluno? Para muitos professores, é “uma criança dócil, paciente, que sabe calar-se escutar o que o professor fala”. O professor, por sua vez, é aquele que sabe, ordena, decide, julga, pune.
6.º)  “Um mundo onde só é admitido falar bem”.  Muitas vezes, a forma espontânea com que a criança fala é corrigida pelo professor, que passa a exigir do aluno a fala “correta”. O resultado é que, geralmente, para não ser repreendida, a criança, deixa de falar ou só fala o mínimo necessário. Sua linguagem torna-se pobre, pouco criativa e a criança sente dificuldade em  expressar-se. Pode também enfrentar problemas em sua identidade pessoa, pois sua linguagem espontânea é um é um dos aspectos da identidade.
7.º) Um mundo “onde só é permitido o que não é proibido”. Você já tentou fazer uma lista das proibições escolares? Ficaria admirado de ver tanta proibição! O que nào é proibido na escola?
 8.º) “Um mundo uniforme, de comunicação artificial”.  A linguagem utilizada pelo professor,  muitas vezes, é uma linguagem artificial, que todos devem falar. As perguntas devem ser respondidas da mesma maneira por todos. Material escolar, livro e atividades são os mesmos para todos. Todos devem adquirir os mesmos conhecimentos, fazer os mesmos exames, ser avaliados pelos  mesmos critérios. Em resumo, todos devem fazer a mesma coisa ao mesmo tempo.
9.º) Um mundo de “punições e castigos”. Quem não se enquadra dentro do mundo uniforme da escola é punido. Nota baixa, repreensão, ameaça, suspensão, etc. São algumas das punições mais comuns em nossas escolas.
10.º)  Um mundo  “ cujo percurso é uma corrida de obstáculos”.  Provas e trabalhos  periódicos, em todas as matérias; aprovação ou reprovação no fim de cada ano; seleção constante, principalmente na passagem de um ano para o outro e de um grau para outro do ensino. Mas os obstáculos são desiguais, para uns mais fáceis e para outros mais difíceis, pois os alunos não têm os mesmos meios para ultrapassar esses obstáculos.
11.º) “ Um mundo com conteúdos estranhos,  que não têm qualquer  significação nem qualquer utilidade imediata para os alunos”. Os exercícios escolares, muitas vezes, nada mais são do que repetições mecânicas e monótonas de palavras e atividades sem sentido para o aluno. Já sabemos que o que não tem sentido nem tem utilidade não satisfaz as necessidades da pessoa, não é aprendido.
12.º) “Um mundo desligado da realidade”.  Um eclipse ocorre e os alunos são proibidos de observá-lo, devem ficar na sala; um fato importante acontece no país e os alunos não podem discuti-lo, não é matéria de aula; o aluno enfrenta diariamente uma série de problemas que não podem ser analisados na escola, não fazem parte de nenhuma matéria.
13.º) “Um mundo de conhecimentos compartimentados, rigidamente hierarquizados”. A cabeça   do aluno é transformada em arquivos com muitas gavetas: uma para matemática, uma para português, uma  para ciência, etc. Em  cada  aula,  o  aluno  abre  uma  gaveta,  enfia  uma  série  de  conhecimentos  lá  dentro,  depois fecha  a  gaveta; na  aula  seguinte,  abre  outra  gaveta  e  assim     por  diante.  Os   conhecimentos   não     são  relacionados,  não   são integrados a um conjunto próprio do aluno;  por isso, são rapidamente esquecidos. Por outro lado, a escola dá mais importância a umas matérias e menos a outra, como pode ser observado pela diferença do número de horas atribuídas a cada matéria. Dá-se preferência ao que é escrito e ao que é dito, em prejuízo do gesto, da pintura, da música; dá-se preferência ao raciocínio abstrato, em prejuízo da observação e da  experimentação.
14.º) “Um mundo comandado por adultos estranhos”. Os professores, muitas vezes, não têm liberdade para trabalhar. Embora tenham  vontade, vêem-se limitados em suas iniciativas. Limitados pelas autoridades, pelos colegas, pelos pais do alunos, pelos programas a serem cumpridos, etc. Na verdade, a escola e os alunos são conduzidos não pelo professor que aí está, em carne e osso, diante deles, mas por adultos que só aparecem através de ordens, leis, normas, regras, etc. É um mundo  burocrático que pesa sobre professores e alunos, atrapalhando muito mais do que ajudando.
Na maior parte dos casos, a escola não leva em considerações diferenças que existem entre as crianças: “diferenças nas condições materiais de vida, diferenças nas experiências adquiridas fora da escola, diferenças de atitudes de pais em relação a escola “, etc. O que acontece, então? Tratar de forma igual aqueles que são desiguais “significa não apenas manter a desigualdade, mas até aumentá-la”. Os que têm mais recursos avançam mais, progridem mais, são selecionados para chegar à universidade, e a desigualdade aumenta ainda mais.
Além dos conhecimentos das matérias escolares, a criança aprende valores e normas comportamentais, principalmente por meio das atitudes que é obrigada a assumir na escola .
De acordo com o mesmo texto da Babette Harper e outros, tais valores e normas seriam os seguintes: “o  aprendizado de cada um por si, da competição”, que leva ao individualismo; “o aprendizado do sentimento de inferioridade”, por parte da maior parte dos alunos, que não conseguem alcançar os primeiros lugares;  “o aprendizado da submissão”, por meio da posição do professor, geralmente destacada da posição dos alunos; “ o aprendizado do respeito pela ordem estabelecida”, o aprendizado do “medo do conflito” e da discussão ­­__nada melhor que a harmonia, a conciliação, a concordância. Com isso tudo, cria-se a homogeneidade, a uniformidade, contrárias à criatividade, à liberdade, ao desenvolvimento pessoal.
·          A  REAÇÃO DA CRIANÇA

Diante do que encontra na escola, a criança reage. A maioria desiste de continuar os estudos, dá-se por vencida.
A escola  não é adequada à maioria das crianças brasileiras, que vive em condições precárias.  O que acontece, então? Como a criança reage à escola? O que acontece com a criança, diante de tudo o  que a escola lhe oferece? Certamente vai haver um choque, em que o lado mais fraco leva a pior. O resultado é o “fracasso” escolar da maior parte das crianças.
Vimos que esse fracasso não resulta tanto da falta de capacidade da criança, mas principalmente da inadequação da escola às características das crianças que procedem de ambientes pobres, como os que existem na maior parte do Brasil. Essas crianças precisam de outro atendimento, pois suas características fazem com que não reajam positivamente ao atendimento atualmente oferecido pela escola.
Quais são as características dessas crianças, em relação a tudo  o  que  encontrem   na  escola ?  Lindgren  (op.  Cit. , p.  545-7) apresenta as conclusões de uma pesquisa, que dão uma idéia da inadequação da escola e do conseqüente “fracasso” das crianças. Apresentamos a seguir algumas dessas conclusões:
1.ª)  As crianças desfavorecidas  são menos capazes de aprender por recomendações orais, do que as crianças de classe média. Lindgren conta  um exemplo interessante: “Um policial visitou a escola  e falou  às crianças  sobre a necessidade de Ter cuidado ao atravessar a rua. No dia seguinte, quando a professora mostrou-lhe a gravura de um policial auxiliando uma criança a atravessar  a rua , elas insistiram em  que ele  a estava levando para a cadeia. Embora a professora continuasse a interrogá-las, não foram capazes de dizer-lhes que o guarda estava auxiliando a criança a atravessar a rua.”  A explicação é simples: a experiência das crianças só abrange policiais levando  pessoas para a cadeia . Provavelmente, as crianças tinham visto várias vezes policiais prendendo gente e nunca policiais ajudando a população. Nesse caso, não adianta falar, pois a experiência da própria criança fala mais alto.
2.ª) As crianças desfavorecidas tendem a apresentar períodos mais curtos de atenção e, conseqüentemente, têm dificuldades  em seguir instruções. Essas crianças necessitam de atividades variadas, que exijam pequenos períodos de atenção. Um exemplo citado por Lindgren: “Uma  criança  que  estava  trabalhando  com  um   grupo na  decoração  de  papel  de  embrulho para  o  Natal,  retirou-se quando  não  foi  auxiliada  pelo  professor  na etapa seguinte, embora o trabalho das outras crianças da mesa pudesse ter sido usado como exemplo  para  o  que  deveria  ser  feito  em  seguida.    ”  Na  escola,  principalmente   nos  primeiros  anos,  períodos   de  atenção  e  concentração  em   uma  atividade  devem ser  intercalados  com  períodos dedicados a outras atividades ou ao descanso  e  conversas  com  os  colegas.  A  capacidade  de   atenção desenvolve-se aos poucos, com o treinamento em períodos cada vez mais longos. 
3.ª) As experiências das crianças desfavorecidas são mais limitadas no que se refere às atividades escolares. Muitas crianças não conhecem os objetos usados na escola. Muitas vezes, desconhecem realidades só vivenciadas por crianças de classe média: parque, restaurantes, carro, etc.
Outro aspecto salientado pela pesquisa refere-se ao esforço. A escola geralmente trabalha com reforços e recompensas simbólicos: notas, diplomas, elogios. Parece que a criança desfavorecida é mais sensível a reforços concretos, palpáveis, por causa da precariedade de suas condições de vida: Pode  preferir uma barra de chocolate a uma nota, um doce pequeno hoje a um doce grande na semana que vem, etc.
Na verdade, a aprendizagem que depende de reforços ou recompensas externos é sempre menos eficiente. A motivação mais eficiente para a aprendizagem é a que vem de dentro do indivíduo, de seu desejo espontâneo de aprender, de sua curiosidade natural, de seu impulso para o crescimento.

·          O QUE FAZER?

A escola  não é um sistema isolado, independente. É uma peça da engrenagem maior, a sociedade. Por isso, provavelmente a escola só mudará na medida em que mudarem as estruturas sociais injustas e discriminatórias. Entretanto, o professor não pode aguardar tais mudanças. Ele precisa exercer sua  profissão e fazê-lo de forma  autêntica e coerente, ele estará contribuindo, através da educação, para transformar  a realidade que o circunda.
A maior parte dos assuntos de Psicologia da Educação foi abordada no sentido de procurar promover a  mudança da atividade escolar,  com  vistas  ao  desenvolvimento  espontâneo  e  integral  do aluno, o que, certamente, estimulará sua participação na transformação da sociedade.
Um princípio básico deve ser sempre lembrado: a criança emprega todos os esforços e capacidades quando trabalha para objetivos reais e significativos, em função de suas necessidades, motivos e intenções e de suas experiências anteriores. Se a criança for “obrigada a participar de experiências que não estão ligadas à realização de seus objetivos e intenções, ocorrem efeitos contrários -     apatia, aprendizagem superficial, frustração, atitudes negativas, indisciplina e desajustamento” (Mouly. Op. Cit., p. 481-2). Na tentativa de aplicação deste princípio, alguns pontos mínimos devem ser considerados:
               a) Compreensão da criança: por meio dos princípios psicológicos que orientam seu desenvolvimento; das características da idade em que se encontra; de suas experiências anteriores, interesses, valores, objetivos, etc.
                b) Um currículo adequado:  as experiências escolares devem ser selecionadas de acordo com as caraterísticas de cada  criança, o que implica experiências diferentes para cada aluno. Além  do conteúdo dessas experiências, o método de trabalho também é fundamental: não é possível utilizar com as crianças das primeiras séries do primeiro grau os mesmos métodos utilizados no segundo grau.
               c) Uma situação social propícia para a máxima realização da criança: as crianças da sala de aula devem formar um grupo coeso, em que cada um aceite seus colegas, e  em que haja uma comunicação eficaz entre os alunos e entre o professor. Como líder do grupo, o professor deve ser capaz de relacionar-se de forma  positiva com as crianças e de estimulá-las, para que busquem com entusiasmo a própria realização.
d)  Orientação eficiente do processo pelo qual a criança deve realizar suas responsabilidades: a orientação é necessária, no sentido de que o aluno se envolva de forma pessoal e ativa no processo de aprendizagem, a partir de seu desejo natural de aprender e se desenvolver.
e) Um professor competente, sensível e dedicado: algumas qualidades pessoais são importantes para o exercício do magistério:
- compreensão ampla do assunto que ensina;   
- capacidade criadora para preparar situações de aprendizagem estimuladoras para a criança, favorecendo seu desenvolvimento máximo;
- sensibilidade para com as necessidades, problemas e preocupações dos alunos, tendo como norma básica de conduta o respeito à dignidade e à individualidade de cada criança:
- consciência de sua responsabilidade como professor, de sua importância enquanto líder dos alunos, com influência sobre o desenvolvimento das crianças e a forma como passarão a encarar e a viver a vida.








BIBLIOGRAFIA


- Bruno, Afonso. Sinopse de Psicologia geral. Fortaleza:
       Secretaria de Cultura e Desporto, 1986.
- Henneman, R. O que é psicologia. 3ª ed. Rio de Janeiro,
       José Olympio, 1974.
- Morgan, Clifford Thomas. Introdução à Psicologia.
       São Paulo; Editora Mcgraw – Hill do Brasil, 1977.
-          Dicionário Aurélio.
- Mueller, F. L. História da Psicologia. São Paulo, Nacional, 1968.
- Pikunas, J. Desenvolvimento humano. São Paulo, McGraw –
       Hill do Brasil, 1979.
- Wertheimer, M. Pequena história da psicologia. São Paulo,

       Nacional, 1972.            

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Ser professor é ter o nobre ofício de exercer a arte de ensinar.